domingo, 30 de outubro de 2011

“UM MISTO DE ACANHAMENTO E AUDÁCIA...”: REFLEXÕES EM TORNO DA IDENTIDADE SERGIPANA (1910-1930)

O ilustre historiador, Silvério Leite Fontes defendeu a ideia de que não podemos pensar a identidade do sergipano sem compreender o seu complexo de “inferioridade” e os mecanismos de compensação desse sentimento. Diz ele que desde os tempos coloniais há a consciência da inferioridade de Sergipe em relação à Bahia e diante do todo brasileiro. Segundo Fontes, “a insegurança psicológica do sergipano exige que seus nomes maiores sejam reconhecidos pelos outros, para, somente assim, calarem fundo na valorização própria”. O autor quer dizer que os nomes dos sergipanos que se projetaram fora do Estado ficam na memória coletiva sergipana.

                                                       Silvério Leite Fontes. Fonte: Google

Tobias Barreto, por exemplo, é um nome que evoca no sergipano uma representação da sergipanidade. É um individuo que aglutina a identidade de uma coletividade. Tanto no passado quanto nos dias atuais, a identidade sergipana se constrói a partir das potencialidades das figuras dos homens que se destacam no campo da intelectualidade, da arte e da política. Vale ressaltar que essa escolha do ser sergipano é compreendida como mecanismo de compensação do sentimento de inferioridade que existe no sergipano desde os tempos coloniais.
Acreditamos que essa identidade a que ele se refere fazia parte da elite sergipana, principalmente de um grupo seleto de intelectuais preocupados com a construção da identidade sergipana. Os anos de 1870 a 1900 foram os primeiros tempos onde uma elite intelectual começou a elaborar textos em Sergipe, sobre Sergipe e para Sergipe. O uso da biografia dos considerados ilustres sergipano por parte da elite intelectual começou no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Dentre as instituições fundadas nas décadas de 1910 e 1920 em Sergipe, nenhuma se comparou ao Instituto quanto a ser um espaço onde se pensava quem era o sergipano, qual o seu território e, sobretudo, como seria o futuro de Sergipe. (SOUSA,1993: 32-33).
                       Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Fonte: Google

A elite nessa instituição contribuía para forjar uma identidade para o sergipano como parte de mecanismos sutis da nova ordem social que Aracaju começava espreitar. Fundado em 1912 por Florentino Teles de Menezes , a referida instituição promovia grandes debates sobre questões nacionais e locais, através de artigos de sua revista, nas sessões com os associados e, principalmente, nas palestras promovidas. Boa parte dos debates procurava trilhar uma perspectiva de exaltar os “grandes fatos e vultos” do passado e do presente e a busca das “origens” de Sergipe, principalmente no que tange aos seus limites com a Bahia. É no Instituto que se dá o prosseguimento do debate sobre as divisas territoriais de Sergipe com Alagoas e principalmente com a Bahia.
Os intelectuais alargaram o debate sobre o território sergipano, reforçando a tese de que a Bahia se apossou de boa parte de terras de Sergipe. Os que se destacaram no passado no campo político, artístico e intelectual são relembrados como inspiradores de uma nova era para Sergipe. São vistos como modelos de homens que venceram os problemas físicos e sociais no Estado. Em sua maioria, os que se destacavam no imaginário da intelectualidade do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe eram relembrados como homens que, vencendo as dificuldades na sua terra natal, conseguiram se destacar a nível nacional ou internacional. Entre estes sergipanos estavam Tobias Barreto, Horácio Hora, Fausto Cardoso. Suas biografias eram elaboradas e publicadas na revista do Instituto, nos jornais “oficiais” e eram motivos de palestras. Além do mais, seus nomes eram emprestados a escolas e, ainda em homenagem a eles, criavam-se monumentos.
Além dos sergipanos “importantes”, outros nomes que não eram do próprio Estado foram notificados como também “grandiosos colaboradores” do Estado. Inácio Barbosa é um destes nomes. Nas comemorações dos cem anos da Independência de Sergipe da Bahia, essa elite intelectual passou a produzir muitos trabalhos sobre a História de Sergipe, inclusive criando espaço de destaque para a história de Aracaju, especialmente a transferência da capital.
Reforça-se a ideia de que o ato da transferência da capital foi um impulso grandioso, um projeto que possuía visão mais larga do futuro. Inácio Barbosa é resgatado como herói. Fazem dele um dos precursores do voluntarismo e como um dos melhores representantes da alma sergipana. Reconhece-se nele o jeito audacioso como se fosse um sergipano que enfrentou as dificuldades do meio físico e social. Sua imagem era trabalhada para servir de modelo aos que acreditavam numa nova fase para Aracaju.
Havia um certo desejo por parte da intelectualidade sergipana de resgatar exemplos de gente que, no passado, se destacou também no campo intelectual. Neste sentido, Tobias Barreto é resgatado como um exemplo a ser transmitido às gerações. Na construção de sua biografia, ele aparece como uma pessoa pobre, talentosa e audaciosa.
O estudo da relação entre homem e natureza tornou-se uma outra questão que a intelectualidade discutia no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe.
O pensamento de Sampaio, neste sentido, não se distanciava das ideias discutidas no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Forjando uma concepção de História para a sociedade, muitos que frequentavam esta instituição excluíram a ação histórica dos diferentes segmentos sociais que nela atuaram, as experiências e os projetos diferenciados, tornando sujeitos históricos aqueles que invariável e “naturalmente” conduziram os destinos da nação e da comunidade. O saber da história de Sergipe era voltado para o culto ao herói e ao condicionamento do amor, à obediência e ao respeito às instituições sociais.

Referência:

SOUSA, Antônio Lindvaldo. “Um misto de acanhamento e audácia...”: reflexões em torno da identidade sergipana (1910-1930). In:_____Temas de História de Sergipe II. São Cristóvão: Universidade Federal de Sergipe/CESAD, 2010. 

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